segunda-feira, 3 de maio de 2010

O que é crise (parte 2)

Como complemento da postagem publicada no dia 29 de abril "Crises" o irmão Andrew Roger nos enviou este texto como um Raio X da crise. Vale a pena ler, afinal, o texto é de Leonardo Boff.
De crise vem critério que designa a medida pela qual dis – cri – minamos e separamos o autêntico do inautêntico.No campo social a crise somente é superada, dizíamos acima, quando uma de – cisão eficaz abre o caminho de solução.A de – cisão que costura a cisão pertence ao processo do enfrentamento positivo da crise.Ora, este é sentido principalmente da palavra krisis em grego que subjaz também à crise em português.Quando cai a decisão (krisis) num processo judicial, acabou o impasse dos prós e dos contras; estabelece-se uma nova realidade; igualmente a decisão do médico, analisando os sintomas da doença, muda o rumo da apreciação ( krinein em grego significa julgar).São João, no seu evangelho, usa cerca de 30 vezes a palavra crise, no sentido de decisão, juízo e ruptura.Jesus é a derradeira crise para o mundo (Jo 3,1-21; 3,31-36); sua atuação produz crise nos ouvintes: devem decidir-se, pró ou contra; a crise introduz a divisão entre a luz e as trevas (Jo 3,19-20) ou entre a vida e a morte (Jo 5,24).Crise, portanto, é oportunidade de uma decisão que pode produzir um acrisolamento e uma purificação.A crise é sim uma descontinuidade mas normal no processo de vida; não é sinal de uma catástrofe iminente, mas o “momento crítico” em que a inteira sociedade se questiona sobre o tipo de relações que possui e qual é seu destino coletivo.Como dizia Ortega y Gasset, que em 1942 escreveu um dos mais lúcidos ensaios sobre a crise (Esquema de las crisis y otros ensaios):“A crise é um momento histórico em que não muda algo no mundo, mas em que o mundo inteiro muda.”A crise se dá no processo de passagem de um mundo (ou de uma ordem) para outro ou de um sistema econômico a outro.Dizíamos que a verdadeira questão não é a crise, mas as atitudes em face dela. Vamos considerar, rapidamente, algumas delas:Os apocalípticos: são aqueles que vêem a crise como uma catástrofe e um fim do mundo (daí apocalípticos); na verdade não acaba o mundo mas um tipo de mundo, aquele no qual vivem e se beneficiam.Bem dizia um pedagogo e filósofo suíço que ama muito o Brasil, Pierre Furter : “Caracterizar a crise como sinal de um colapso universal é uma maneira sutil e pérfida dos poderosos, dos privilegiados, para impedirem, a priori, as mudanças, desvalorizando-as de antemão.”São de tal maneira contra que não possuem quase nenhuma coisa pela qual poderiam estar a favor.Há os arcaizantes: são aqueles que se agarram às fórmulas do passado; procuram para os problemas de hoje as respostas de ontem.Permanecem na crise.Há os futuristas: são normalmente as vanguardas sectárias, os críticos mais audazes mas com soluções que não integram os principais elementos dos problemas, capazes de criar um consenso novo e promissor.Podem ser brilhantes, mas geralmente são estéreis.Há os escapistas : são aqueles que encontraram uma solução somente para a sua classe e escapam para este mundo reconciliado. Fecham-se sobre suas fórmulas tecnocráticas e não dão ouvidos a mais ninguém. Estiolam na crise.Há os res – ponsáveis : são aqueles que não fogem nem para frente, nem para trás, nem para dentro, mas procuram dar uma res – posta (daí responsáveis que vem de responsum em latim ) adequada às forças em presença; aprendem do passado , mantêm-se abertos ao futuro, não temem as rupturas necessárias, sem perder o sentido do todo; vêem na crise chance de crescer, para isso mudar, acrisolar-se de gangas do passado, decidir-se para ser mais.A superação da crise não se faz pelo ativismo ou pela excitação, mas pela lucidez que identifica o nó problemático, pela decisão do corte que põe termo à decomposição e pelo projeto novo adequado ao chamado da hora.A quem a última palavra ?Todos nos encontramos dentro de uma situação-de-crise.Importa definir-se bem dentro dela, especialmente os que ocupam os lugares sociais de decisão.Se houver res-ponsáveis, até a crise econômica terá um desfecho feliz.Platão sabiamente advertia em sua Politeia : “Todas as coisas grandes acontecem no meio de um grande risco.” {Jornal Folha de São Paulo – OPINIÃO (Tendências /Debates) Quinta-feira 07 de julho de 1983. P. 3} Leonardo Boff (téologo)
Enviado por Andrew Roger

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